Diversidade, esperança e oportunidade
A metáfora de que o país é uma nau que prossegue por entre bonanças e tempestades não é tão boa quanto alguns pensavam. O capitão assumiria a triste imagem de um ditador e nós, os marujos, tingiríamos o nosso rosto de marionete com o doce brilho da cegueira. Com a cabeça focada nas manutenções rotineiras da embarcação, às vezes nos esqueceríamos do rumo a se tomar e, pior ainda, estaríamos aprisionados na rota imposta pelo “capitão”. Portanto, a metáfora não serve e, se quisermos ainda insistir na alegoria, teríamos que repensá-la melhor.
Não precisamos de muita teoria para percebermos que se torna muito mais cinza um mundo sem diversidade. Se consumirmos apenas um tipo de nutriente, a dieta fica demasiado empobrecida e o organismo sucumbe. No plano político atual, a nuvem cinza que paira sobre os nossos lares é ainda mais escura. Hoje parece que aceitamos muito facilmente as soluções paliativas que os governantes nos oferecem. Olhamos para o lado e não escutamos mais o nosso grito refletido na voz de uma oposição vigorosa. Defende-se muito o discurso democrático, mas se utiliza deste lema para se distribuir cargos, minar a crítica construtiva de qualquer possível oposição e fortalecer cada vez mais um único tipo de discurso e conduta política.
No Brasil de hoje há uma inflação de instituições públicas sustentadas mensalmente por nós. Não vemos o retorno esperado por tudo o que pagamos. São 39 ministérios e órgãos federais que, na prática, servem para solidificar alianças políticas de forma a se manter no poder. Já perdemos nessas contas: paga-se muito e o retorno é pequeno. Oferecem-nos sempre incontáveis soluções paliativas. Os governantes fazem infundados acordos com outros países e distribuem ajudas financeiras com o nosso dinheiro público. Do lado de cá, esse mesmo nosso dinheiro público é utilizado para distribuir bolsas mensais para a população de baixa renda, sem critérios eficazes de fiscalização, melhoria real da qualidade de vida das pessoas e perspectivas de um futuro melhor.
Oferecem-nos festivais de circo. O problema não é, por exemplo, termos sediado mais uma Copa do Mundo, mas sim, termos assistido o governo federal prontamente correr contra o tempo para dar cabo de obras bilionárias exigidas pelos organizadores do evento. Enquanto isso, ainda assistimos diariamente festivais de horror em nossos hospitais devido à falta de condições básicas. O problema não é ter perdido o Campeonato Mundial, mas sim perder diariamente em qualidade de saúde, educação, transporte, segurança, infra-estrutura e gestão pública. Qual é o nosso foco afinal? Quais são as nossas prioridades? A seleção brasileira perdeu novamente em casa. Menos mal. Pior é ver o país continuar sendo derrotado inúmeras vezes no plano político, social e econômico. É inegável que o país precisa de mudanças urgentes.
Temos que buscar força e fé para lutarmos pela nossa própria casa. O pensamento sadio e crítico deve ser restabelecido, devemos valorizar a discussão política. Devemos nos interessar e integrar mais neste processo de melhora do país, nas possibilidades de mudança, de transformação, de modernização. Não podemos deixar que quaisquer governantes usem desse poder que nós próprios lhes confiamos para calar este valor da cidadania. Temos que pensar em melhores formas de controle das nossas instituições, para não permitir a supremacia de apenas um tipo de conduta, discurso ou partido político. Ao fazermos isso, estaremos fortalecendo a diversidade dos nossos valores e espírito crítico, para termos condições de lutar por um país melhor. É neste contexto, aqui delineado, que diversidade, esperança e oportunidade se misturam e se sobrepõem.
João Araújo
artigo publicado no Diário de Pernambuco
Quarta-feira, 27 de Agosto de 2014